Projeto Meu Endereço fecha ciclo de capacitação com foco na produção social do espaço urbano
A Universidade Federal do Pará (UFPA) e a Secretaria de Estado de Ciência, Tecnologia e Educação Profissional e Tecnológica do Estado do Pará (Sectet) concluíram, no último dia 22 de julho, quarta-feira, por videoconferência, a realização do Curso de Agente de Cadastramento do Projeto Meu Endereço: lugar de paz e segurança social.
A capacitação articula o intercâmbio de conhecimento sobre atividades de assistência técnica, inovação tecnológica e inclusão social para reduzir os índices de conflitos socioambientais urbanos, que são marcados pela falta de delimitação do terreno, instalações sanitárias inadequadas e questões fundiárias. Essas realidades afetam os territórios do Icuí-Guajará, em Ananindeua; bairro Nova União e São Francisco, em Marituba; Cabanagem, Guamá, Benguí, Terra Firme e Jurunas, em Belém.
O VI e último módulo do Curso de Agente, desenvolvido em dois dias, trabalhou conteúdos, orientações e protocolos da Central de Atendimento Multiprofissional do projeto, além das legislações brasileiras que regem a ocupação do espaço urbano. Foram debatidas as Leis federais 10.257/2001 e 11.888/2008. Esta última garante assistência técnica e tecnológica em direito à cidade e à moradia em prol do desenvolvimento socioambiental, além de assegurar às famílias de baixa renda assistência técnica pública e gratuita para o projeto e a construção de habitação de interesse social. 90% dos conflitos vicinais têm origem em aspectos fundiários ou construtivos nas comunidades, que são afetadas pela ausência de uma política pública de moradia para as famílias.
Áreas de riscos - Myrian Cardoso, coordenadora do Projeto Meu Endereço, afirmou que os dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) revelam que aproximadamente 70% da população vivem em áreas de ocupação social, via de regra, áreas públicas de interesse ambiental, como em encostas e várzeas, ou em faixa de domínio de rodovias ou nas localidades denominadas terrenos de marinha, que podem ser da União ou foram repassadas para os estados e os municípios, onde residem famílias ribeirinhas.
Segundo dados do Conselho de Arquitetura do Brasil (CAU-BR), 80% das construções não têm acompanhamento de um profissional de arquitetura ou de engenharia e são edificadas em áreas sem estruturas públicas e solos inadequados. “O mercado imobiliário não tem interesse econômico nestas áreas”, enfatizou Myrian.
Discutiram-se, também, os efeitos da Lei Federal nº 13.465, de 11 de julho de 2017, que dispõe sobre a regularização fundiária urbana na Amazônia Legal. Neste contexto, as demandas comunitárias sistematizadas pelas equipes do projeto e debatidas no curso revelam que as famílias dos sete territórios precisam da assistência técnica para a regularização fundiária, a resolução de conflitos socioambientais e de vizinhanças. “Realidade urbana que a parceria entre a Comissão de Regularização Fundiária da UFPA e a Sectet abraçou em busca de construções de soluções com a participação da comunidade”, diz a coordenadora, antecipando que haverá formatura dos participantes em breve.
Élcio de Moraes, consultor jurídico do projeto, esclareceu aos participantes que os conflitos territoriais decorrentes das desigualdades sociais, econômicas e da ausência de um ordenamento cidadão do acesso à terra exigem, quase sempre, uma mediação, uma conciliação e a realização de uma arbitragem para assegurar, com um olhar técnico, profissional e social, a construção da paz nos territórios.
Em 1920, segundo ele, o Brasil era agrícola e 70% da população viviam no campo; e 30%, nas cidades. Na década de 90, esse cenário se inverteu e 70% da população passaram a residir nas cidades; e 30%, no campo. Em 2015, 83% moravam nas cidades e, até 2030, a expectativa é de que 90% das populações viverão nas cidades. “A democratização do espaço urbano é fruto da participação da comunidade”, alertou.
Participação ampla - Neste contexto, Renato das Neves, engenheiro e pesquisador da CRF-UFPA, enfatiza a força da capacitação e o trabalho desenvolvido pelas equipes do projeto antes da pandemia da Covid-19. Foram realizados cursos de Direito à Cidade e Regularização Fundiária, além das Rodas de Conversas, apresentações teatrais, cantorias e as Quintas da Cidadania.
A capacitação mobilizou profissionais de várias áreas do conhecimento, construiu um novo olhar sobre o acesso à cidade e às condições de cidadania e à dignidade da pessoa humana. “Todos podem mediar os conflitos socioambientais nos territórios. O conhecimento é uma ferramenta para combater a violência, a intimidação e a ameaça”, disse.
O resultado do trabalho de campo durante um ano, segundo Renato, construiu a condição, a identificação e a comprovação do endereço de cada família. No projeto, esta comprovação nascerá com a sistematização das informações de cada família, por meio de uma plataforma computacional de elaboração e a emissão do Kit Meu Endereço. O kit é composto de planta de localização do imóvel, planta de limite de lote, laudo de condições socioambiental da moradia, laudo de avaliação do imóvel e guia de encaminhamento para a solução das demandas da comunidade junto aos programas do governo do Pará ou para outras esferas públicas” disse.
Para o Caio Tavares, historiador, morador do bairro Jurunas e integrante do projeto, o intercâmbio de conhecimentos com a realidade e profissionais dos diferentes territórios ampliou o seu olhar sobre a função social da cidade.
“Como historiador, aprendi mais sobre o funcionamento do bairro, da cidade, da sociedade e os seus conflitos urbanos. É um conhecimento que não ficará retido só para mim. Compartilharei para além da comunidade do Jurunas”, enfatizou. O Projeto Meu Endereço: lugar de paz e segurança social integra o Programa TerPaz do Governo do Pará e visa a beneficiar cerca de 370 mil pessoas diretamente, em especial as vítimas da criminalidade, as mulheres em situação de risco e os jovens de 15 a 29 anos nos sete bairros localizados em três cidades da Região Metropolitana de Belém (RMB).
Texto e fotos: Kid Reis – Ascom-CRF-UFPA
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