Dia Internacional para Eliminação da Discriminação Racial reforça o combate ao racismo no Brasil e na Amazônia
O dia 21 de março é instituído pela Organização das Nações Unidas (ONU) como o Dia Internacional para a Eliminação da Discriminação Racial. A data homenageia a memória das vítimas do “Massacre de Sharpeville”, que ocorreu na província de Gautung, na África do Sul, durante o regime do Apartheid. O objetivo da criação da data é reforçar a importância do combate a toda e qualquer prática racista, que lamentavelmente persiste na sociedade atual, tal como no Brasil e na Amazônia.
Constantemente, inúmeros casos de preconceito e discriminação racial entre pessoas negras são noticiados pela grande mídia. As ocorrências excluem, inclusive, o nível de instrução educacional, a ascensão social e a popularidade de negros e negras que são vítimas de preconceito e discriminação. Um dos casos mais recentes e com larga visibilidade foi a prisão indevida do famoso diretor de cinema estadunidense Ryan Coogler, responsável pela direção do filme Pantera Negra, após uma tentativa de sacar o seu próprio dinheiro em uma das agências do banco “Bank of America”. O cineasta só foi liberado depois de comprovar a sua identidade com uma carteira de motorista e um cartão do banco.
Segundo a professora Antonia Brioso, situações como essa ocorrem de maneira frequente, uma vez que se criou um medo e uma desconfiança sobre a pessoa negra. “O racismo cria hierarquias e assimetrias. Logo o que era e é relacionado às culturas ditas ‘hegemônicas’ e 'dominadoras' passam a ser tidas como superiores. O racismo é violento, massacra, humilha, causa danos à subjetividade da vítima”, afirma a professora.
No Brasil, não houve uma legislação para regularmentar a segregação racial após a abolição da escravatura, tal qual nos Estados Unidos ou na África do Sul, o que possibilitou a crença no mito da “democracia racial” aqui, o qual declara que o fato de o Brasil ser um país fortemente miscigenado não acarreta práticas racistas e discriminatórias.
Um dos maiores defensores dessa visão é o sociólogo Gilberto Freyre, que popularizou a ideia de “harmonia racial”, em sua obra Casa-Grande e Senzala. Contudo o recorte do sociológo sobre a formação da sociedade brasileira é equivocado, dadas as inúmeras disparidades sociais entre brancos e negros no páis. Um exemplo claro é o racismo estrutural, “disfarçado” em pequenas ações, seja por meio da ocupação significante de pessoas brancas em espaços de poder, seja pela exclusão de suas culturas, crenças e identidades.
Racismo e Discriminação Racial na Amazônia - A Amazônia é uma região onde a formação de uma sociedade pluriétnica se dá de maneira mais acelerada, dada a intensa junção entre os povos indígenas, africanos e europeus. Ainda assim, com a presença de tal característica, apresenta fortes marcas de um processo de colonização discriminatória, evidente na construção de sua população e, principalmente, na divisão de seu território.
“Os povos indígenas e os afro-brasileiros foram inferiorizados pelo ocidentalismo europeu, onde a sua mentalidade colonial deu seguimento a essa visão. Esse processo histórico ainda está presente na luta das comunidades quilombolas, povos originários que reivindicam seus direitos e fortalecem suas identidades culturais numa trama política muito interessante. Essa grande parte da população brasileira está adentrando as universidades, e tem lutado por escolas que conheçam suas realidades étnico-raciais”, assegura a professora Antonia Brioso.
De acordo com a professora, a única forma de mudar a realidade do racismo no Brasil, especialmente na Amazônia, é por meio da Educação. “A escola tem um papel fundamental no debate, na denúncia e no combate ao racismo. Temos que ensinar desde o nível inicial da educação - a educação infantil - e irmos até a pós-graduação ensinando a ser antirracista. Precisamos incorporar essa atitude nas nossas práticas pedagógicas.”
Projeto Cartografia da Cultura Afro-Brasileira e Indígena - Em 2003, foi declarada a Lei 10.639/03, que alterou a Lei de Diretrizes e Bases da Educação e incluiu, no currículo oficial da Rede de Ensino, a obrigatoriedade da presença da temática "História e Cultura Afro-Brasileira e Africana". Com isso, as escolas passaram a adequar seus currículos para um ensino e educação antirracistas que preservassem a identidade negra e suas múltiplas características. Assim inúmeros projetos foram criados e idealizados a partir dessa temática. Um deles foi o Projeto Cartografia da Cultura Afro-Brasileira e Indígena, que é realizado na Escola de Aplicação da UFPA e coordenado pela professora Antonia Brioso.
A iniciativa nasceu em 2012, com o intuito de proporcionar o ensino de diferentes disciplinas com base na implantação de um currículo decolonial que valorizasse a narrativa da população negra e indígena na Amazônia. A professora Antonia Brioso assegura que mais de mil estudantes, ao longo de duas décadas, foram apresentados a essa metodologia de educação multi/intercultural e étnico-racial.
“O Cartografia tem demonstrado as vantagens pedagógicas que acontecem não só no processo de ensino e aprendizagem dos discentes, mas também em muitos outros aspectos, como na formação de uma cultura de pertencimento nos estudantes afrodescendentes e mestiços, um caminho fortalecedor para o empoderamento desses sujeitos”, alega Antonia Brioso.
Ações como essa, produzida pelo Projeto Cartografia da Cultura Afro-Brasileira e Indígena, contribuem para a valorização da identidade de povos e raças que foram violados e negligenciados durante todo o processo de colonização brasileira. Por isso a importância de atividades que reforcem o apagamento de uma ideologia racista e eurocêntrica, tristemente enraizada no país.
“Esse apagamento é fundamental para a forma como as pessoas negras se assumem ou como os outros as assumem dentro das relações sociais e das diferenças culturais, uma vez que uma educação antirracista produz uma mudança significativa nas nossas vidas”, conclui a professora.
Texto: Leandra Souza - Assessoria de Comunicação Institucional da UFPA
Arte: Ascom UFPA
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