Dia dos avós: Colo, atenção e carinho de avó influenciam netos para toda a vida
“Vovucha”. É assim que a servidora pública Glauce Monteiro, 31 anos, chama carinhosamente a avó Cleonice, de 83 anos. A relação de Glauce com a avó sempre foi de muito afeto e proximidade. “Toda vez que eu preciso de paz, amor, carinho, sempre venho à casa da minha avó. Sinto que aqui é meu verdadeiro lar”, revela.
E a afeição é recíproca. Glauce foi a primeira neta e por isso recebeu uma atenção especial. “Ela é uma neta incrível”, dona Cleonice conta com orgulho. Depois dela, todos os outros netos foram criados ou passaram grande parte da infância na casa da matriarca. “Gosto de ser avó, de cuidar dos meus netos. Por mim morariam todos aqui”, diz dona Cleonice. A energia da casa é tangível, cheia de alegria, com toda a família reunida para o cafezinho da tarde. Casa de avó.
Fabiana, de 9 anos, e Marisa, 10, são as netas mais novas e moram na mesma casa que a avó. Ambas não pensam duas vezes antes de dizer que adoram morar com ela. A vó Cleonice lamenta: por causa da idade, já não tem mais a mesma disposição que teve para ajudar na criação dos outros netos, mas o amor e o carinho são os mesmos.
A mãe da Fabiana e da Marisa, Auxiliadora Monteiro, destaca a importância dessa convivência da avó com as netas e com os outros netos. Ela reforça o desejo de estar sempre próxima da família. “Toda essa relação é de cuidado, de proteção. E mãe a gente quer sempre aqui perto da gente.”
Livens Lopes, de 23 anos, também é neto da dona Cleonice e reconhece o valor do amor de avó. “Avó é uma pessoa que transmite muito amor para os netos. E amor de avó para neto é mais forte que amor de mãe para filho. Pude notar isso agora que tive minha filha, pois minha mãe parece amar mais ela do que me amava”, brinca. Livens é pai da Valentina, de 9 meses, e deseja que a filha também tenha a mesma convivência que ele teve com a avó. “Para aprender a amar os outros e ter respeito com os mais velhos”, conta.
O legado dos avós - As narrativas e costumes de dona Cléo e muitos outros avós são passados de geração em geração. A herança deixada pelos queridos avós é explicada pelo professor e pesquisador da Universidade Federal do Pará (UFPA), Janari Pedroso: “Esse legado deve ser compreendido a partir da transgeracionalidade, um processo em que as informações são passadas entre gerações, criando vínculos”. O professor explica, também, que a transmissão transgeracional diz respeito às crenças, cuidados, práticas e hábitos que se repetem ao longo da vida. E é isso que faz com que a bisneta Valentina receba o mesmo amor e uma criação parecida com a do pai, que recebeu da mãe, que recebeu da dona Cléo.
Mãe-avó - Enquanto dona Cleonice já acompanhou o crescimento dos 11 netos e começa a aproveitar a vida de bisavó, a dona de casa Lúcia Braga ainda desfruta do início da vida de avó. No mesmo bairro, a algumas ruas de distância, Renata brinca com o irmãozinho na casa de Lúcia.
Mais uma manhã comum em casa. Os netos assistiam desenho animado, Lúcia fez o café para o marido, filha e cunhada, e se prepara para a entrevista. Mesmo com vergonha, não hesita em expressar o amor que sentia pelos netos. “Eles são meus pequetuchos”, diz, abraçando Nicholas, seu netinho de 1 ano, e Renata, de 8. Com os netos no colo, um de cada lado, ela conta um pouco da trajetória como avó.
Lúcia se tornou avó muito cedo. Com 38 anos veio a primeira neta, Renata, filha de seu primogênito. Ela morou com a vó desde que nasceu. Por isso, Lúcia assumiu papel de mãe: “Ela é minha neta, mas eu a crio como filha. Ela nunca me chamou de vó, mas ela sabe quem sou”. Para Renata não é diferente, Lúcia é mesmo sua mãe. Para a criança, a explicação é simples: “Porque eu vivi com ela.”
A menina conhece a mãe, mas prefere morar com a avó. Para ela, viver ao lado dos avós “é legal”, fala escondendo o rosto no pescoço da vó. Mesmo com todo o carinho, Lúcia lamenta a falta do contato maternal: “Eu faço de tudo para a Renata ter uma relação com a mãe, mas ela não sente falta. Elas passam até cinco meses sem se ver porque a Renata não se acostuma a ficar em outra casa”. Mesmo assim, Lúcia ainda acredita que ela está melhor ali: “Convivendo comigo ela vai estudar, não é Renata?”, pergunta rindo para neta.
Todos já ouviram por aí que “se os pais foram feitos para educar, os avós são para deseducar”, mas o papel vai além dos mimos. O pesquisador Janari Pedroso afirma: “A criança consegue perceber muito claramente as regras, o que pode e o que não pode. Então, não há problema em ser criado por avô. Afinal, o que determina a boa criação é a autoridade, imposição de regras e limites”, sinaliza.
Quando os papéis se invertem - Avós não são eternos, mas o legado de carinho, amor e cuidado permanece. A história de André Filho com a avó Edmea é exemplo disso. André passou pela experiência de perder a avó, que o criou, ensinou e ajudou nos momentos bons e ruins. André perdeu sua avó em 2016, por causa de Alzheimer.
Como os pais trabalhavam demais, ele e o irmão viveram com os avós até a maioridade, quando André foi cursar a universidade no Rio de Janeiro. “Quando fiz 18 anos eu vi que meus avós não tinham mais condição de cuidar de mim e do meu irmão. Eles são muito fortes, já tinham mais de 80 anos”, lembra com carinho. André sempre tratou os avós como pais, e eles o tratavam como filho: “Meu avô não me deixava jogar mais de uma ou duas horas de videogame. Ele falava ‘esse negócio aí gasta muita luz’. E a minha vó? Eu me lembro até hoje que aprendi a tabuada com ela.”
Mesmo depois do diagnóstico, a vó Edmea estava sempre ativa. “Com 80 anos, ela ainda lembrava toda a tabuada, e tem muito adolescente aí que não sabe”, conta ele, rindo. Depois, isso foi diminuindo aos poucos e quem um dia teve a responsabilidade de cuidar dos netos, agora precisava de cuidados. “Você acha que isso não está acontecendo. Você pensa ‘eu estou aqui ajudando só um pouquinho, mas logo as coisas vão melhorar’, mas aí isso não acontece. Você vê que, cada vez mais, ela precisa mais de você. Aí você precisa estar mais com seus avós do que eles com você”, relata André, emocionado.
Essa inversão de papéis não é nada fácil, mas, em casos como o de André, é necessária. Janari ressalta que a importância de manter as boas relações entre avós e netos vai além da responsabilidade de formar crianças e jovens saudáveis. Afinal, idosos também precisam de cuidados. Segundo o pesquisador, “quando o idoso tem uma dependência física, como o Alzheimer, ele fica muito vulnerável, e se torna propício ao cuidado violento. Por isso, é importante ter alguém que o ame para cuidar dele”. E isso foi exatamente o que André fez.
“O que liga as relações é o amor” - “Os seres humanos são interdependentes, precisam do outro. E as crianças precisam de cuidado afetivo para se desenvolver.”, É o que afirma o pesquisador da UFPA, Janari Pedroso. Os avós têm uma função muito importante de apoio dentro dessa relação. Janari deixa claro que o mais importante é dar apoio e estrutura para o crescimento das crianças. Mais ativos, os avós permanecem cuidando das crianças dentro da rotina corrida dos pais ou deixam registradas as memórias que vão seguir gerações.
A avó Lúcia, que tem três netos, assegura: “Eu sinto o mesmo amor por todos. Não muda nada”. O último neto tem apenas alguns dias de vida, mas o carinho ao falar do recém-nascido é o mesmo que tem com Renata. Os olhos da avó ficam marejados ao falar da honra de exercer esse papel. “É algo inexplicável, ser avó é muito gostoso”, diz dona Lúcia, com um sorriso no rosto.
Dia dos avós - Auxiliadora Monteiro conta que Fabiana e Marisa têm o costume de escrever cartas para a família e amigos. Elas escreveram uma carta para a avó Cléo em homenagem ao Dia dos Avós, em 26 de julho.
“Quando eu me bato, ela é a primeira que me socorre. Ela é carinhosa, é dedicada, é amorosa”, escreve Fabiana, destacando as qualidades da avó. Marisa revela um desejo especial: “Desejo a ela muitos anos de vida. Até os 100 anos de vida ou mais, muito mais. Até o infinito ela vai viver muito e ver meus 15 anos.”
Marisa também fala do avô. Ela escreve que o ama muito e rezou por ele quando o avô esteve doente no hospital. Marisa também agradece que o avô “se preocupa” em comprar açaí para ela e a irmã”. “Desejo um feliz dia dos avós. Parabéns para os dois. Muitas felicidades”, encerra ela.
Texto e fotos: Alice Palmeira, João Pedro Bittencourt, Mariana Vieira e Vagner Mendes – Faculdade de Comunicação da UFPA
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