Declaração do Belém+30 valoriza a diversidade dos povos indígenas e comunidades tradicionais do mundo
Na Declaração Belém +30, apresentada nesta sexta-feira, 10, durante o encerramento do Congresso da Sociedade Internacional de Etnobiologia, realizado no Hangar, na capital paraense, povos e comunidades tradicionais defendem respeito a seus territórios, liberdade de gestão e autodeterminação de seus modos de vida.
O documento aponta, ainda, a necessidade de consulta livre, prévia e informada; a repartição de benefícios; a implementação de programas educacionais diferenciados e adaptados às condições locais; o direcionamento de recursos de ciência e tecnologia para inciativas dos povos tradicionais; a garantia de efetiva punição para crimes ambientais e violações de direitos humanos; além do reconhecimento de saberes, culturas e inovações dos diferentes povos.
A Declaração foi discutida ao longo dos quatro dias do evento, em sessões particulares, que avaliaram conquistas e desafios da Carta de Belém de 1988, baseado nas perspectivas dos diferentes grupos sociais e étnicos participantes. Para a pesquisadora Regina Oliveira da Silva, do Museu Paraense Emílio Goeldi, a declaração renovada é um avanço que chama a atenção para necessidade de olhar e valorizar os diversos povos.
“É destaque no novo documento a inclusão dos povos tradicionais, a inclusão dos movimentos sociais, os pareceres, a realidade vivida e o que mudou em 30 anos. Não podemos achar que a pesquisa é a mesma, não é. E outra coisa, 30 anos atrás a representação era muito mais dos povos indígenas. Os povos tradicionais, quilombolas, ciganos saíram da invisibilidade no movimento de 1990 para cá. Então essa renovação é importante, porque traz outras realidades, outros povos e vão incrementar muito a pesquisa etnobiológica”, afirmou.
Francisco Antônio Guedes, índio tikuna do Alto Rio Solimões, no Amazonas, avalia como positiva a ampliação do debate. “Eu espero que, pro meio dessa carta, o governo reconheça o direito dos povos indígenas, povos tradicionais de nosso país e de outros países. Muitas etnias contribuíram pra fazer essa carta.”
Já Vivian Cardoso, quilombola da comunidade do Abacatal, em Ananideua, Região Metropolitana de Belém, ressalta a conquista em participar com as demandas das populações negras no documento, as quais não foram representadas na Declaração anterior.
“Como é que nós, quilombolas, fomos ignorados? Então nós começamos a participar, colocar nossas demandas na carta e brigamos por cada palavra, porque, às vezes, o estudioso coloca uma palavra que ele entende, mas eu não entendo. Então, essa carta é um grito de socorro, é um grito pro mundo inteiro ver que nós sofremos, mas a gente não desiste, não vai desistir nunca”, declarou.
Conquistas – A Declaração de Belém foi originalmente escrita em 1988, sendo uma referência para a pesquisa etnobiológica e inspiração para trabalhos e tratados internacionais que reconhecem os direitos de povos tradicionais e a defesa da biodiversidade. “Eu acho que a Declaração de Belém foi um importante marco histórico ao colocar cientistas e povos tradicionais juntos para pensar numa causa comum. E essa é uma das razões pela qual ela não foi esquecida ou deixada de lado como muitos documentos. Era algo para ser celebrado, algo que as pessoas podiam olhar e se inspirar para fazer mais. Agora, nós sabemos que temos muitos desafios pela frente”, avalia Mark Plotkin, pesquisador da Amazon ConservationTeam e assinou a edição anterior da carta.
Para o professor Flávio Barros, presidente da comissão organizadora do Belém+30, o novo documento é o principal legado do evento que também deu destaque para a diversidade de saberes e culturas, integrando os povos amazônicos com pessoas de várias partes do planeta.
“A expectativa do Belém +30 foi superada em todos os sentidos. A gente sente que todo mundo foi contaminado por uma grande alegria, uma magia. Foi realmente um aniversário de 30 anos congratulando com as comunidades tradicionais, com a diversidade do Brasil, com a diversidade do mundo”, comemora Flávio Barros, ressaltando a grandiosidade do evento. “Foram quase 50 países aqui presentes, sem contar o envolvimento das crianças na Feira de Ciência e Tecnologia. Realmente, a gente vai concluindo esse movimento com o sentimento de que todo o esforço que a Universidade Federal do Pará, a Secretaria de Ciência e Tecnologia do Estado e o Museu Paraense Emílio Goeldi fizeram foi para cumprir com o seu dever de ter preparado um Belém +30 inesquecível.”
O Belém+30 reuniu o XVI Congresso da Sociedade Internacional de Etnobilogia, o XII Simpósio Brasileiro de Etnobiologia e Etnoecologia, a IX Feira Estadual de Ciência, Tecnologia e Inovação e a I Feira Mundial da Sociobiodiversidade. Durante quatro dias de encontro, os povos tradicionais expuseram produtos oriundos de suas tradições, saberes e relações com a natureza, integrados com a produção científica paraense e mundial. Uma grande troca de experiência respeitando e valorizando a cultura, o modo de vida e toda a diversidade humana.
“Foi muito importante a vinda de todos os povos e comunidades tradicionais para esse evento. Na assembleia realizada, não foi fácil para todo mundo chegar num consenso de construir as novas etapas da carta. E eu espero que ela tenha uma visibilidade mundial, global e tudo que foi pedido dentro dessa carta possa ser respeitado, porque agora o grito não é só dos povos indígenas. O grito agora é de todas as comunidades tradicionais que muito fazem pra continuar mantendo essa natureza maravilhosa que faz parte da nossa vida. Então a importância da carta é essa, porque nós queremos um mundo totalmente cheio de vida”, conclui Shirley Krenak, indígena de Minas Gerais.
Texto: Divulgação Assessoria Belém +30
Foto: Nayana Batista
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