Grupo de cegos vive experiência táctil com peixes
Um grupo de seis pessoas com cegueira e baixa visão viveu, nesta quinta-feira, 28, a primeira experiência táctil com peixes. O Grupo de Ecologia Aquática e Pesca (GEA) do Núcleo de Ecologia Aquática e Pesca da Amazônia (NEAP), da Universidade Federal do Pará (UFPA), em parceria com o Projeto Meros do Brasil, via Ponto Focal do Pará, promoveu a I Oficina Sensorial Inclusiva e despertou a curiosidade de quem nunca pôde conhecer de perto várias espécies marinhas e de água doce.
A estudante Luana Araújo Pereira, 30 anos, concluinte do curso de Letras - Licenciatura em Língua Portuguesa, considerou a experiência única, porque agora vai criar seu próprio conceito sobre os peixes que conheceu e não mais imaginar baseada na descrição feita por outras pessoas. "É uma diferença muito grande tentar imaginar, porque a imaginação nunca vai ser o real. Mas, depois desse contato táctil, tudo fica mais concreto e fácil para nós", completou ela, que nasceu com glaucoma e tem apenas 10% da visão desde a infância.
Além disso, Luana avaliou que a iniciativa é fundamental para promover a inclusão efetiva de portadores de deficiência visual. "Nós queremos e precisamos desses contatos. Isso é primordial. Muito se fala de inclusão, mas a teoria é bem diferente da prática. Para nós, essa não foi uma pequena iniciativa, foi grandiosa, porque, quando cada um faz a sua parte, nós vamos ganhando mais espaço", pontuou.
Os participantes puderam conhecer mais e aprender tocando em algumas espécies, como mero, rêmora, baiacu, tubarão liso, tubarão martelo, arraias treme-treme e borboleta, entre outros. Segundo o professor Tommaso Giarrizzo, que coordenou a oficina, o encontro foi uma aula de Educação Ambiental para tratar sobre vários assuntos, como lixo, consumo, poluição de rios e mares, e também tirar dúvidas. Os monitores que apresentaram as espécies para os participantes foram Valéria Mourão, Fabíola Seabra, e Jeferson William da Conceição, que é o único mestrando do Programa de Pós-Graduação em Ecologia Aquática e Pesca da UFPA com baixa visão.
O pedagogo Lourival Nascimento, de 51 anos, disse ter "revisitado a memória visual" ao tomar contato com os peixes na manhã desta quinta. "Eu não tinha mais essa memória. Fiquei cego aos 15 anos. Para mim, foi um momento muito instigante, porque tem tudo a ver com a nossa região, e essas inciativas nos ajudam a criar nossa identidade, fortalecer nossa cultura", completou.
Ele, que nasceu com atrofia do nervo óptico e teve perda acelerada da visão na adolescência, quer levar essa mesma oficina para 65 estudantes da rede municipal de ensino, que fazem parte do Centro de Referência em Inclusão Educacional da Prefeitura de Belém. "Esse projeto precisa chegar também à Escola Álvares de Azevedo, na qual existem 226 alunos com baixa visão, cegos e com deficiências múltiplas", sugeriu.
Enxergar com a ajuda de outros sentidos, como o tato e o olfato, agora é a realidade do calouro de Licenciatura em Dança, da Universidade Federal do Pará, Marco Antônio Silva Lopes, de 30 anos. Cego há um ano e 11 meses, foi amor ao primeiro toque com a arraia borboleta. "É muito delicada e, na água, deve ser muito linda, pelo formato que tem", revelou. Ele sofreu um descolamento da retina durante um tratamento de catarata e, durante a oficina, até se arriscou a carregar a cabeça de um mero, que pesa mais de 10 quilos. "Eu não imaginava que era tão grande assim", descreveu.
O aposentado Agostinho Nunes Brito, de 67 anos, levou até a esposa, Madalena, de 65 anos, para reviver seu tempo de pescador. "Só posso dizer que meu dia foi maravilhoso por causa dessa oficina", finalizou.
Texto: Micheline Ferreira – Divulgação
Fotos: Divulgação
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